Macroeconomia

Novo Arcabouço Fiscal: parecer final do relator trás alterações relevantes

Após cerca de um mês da divulgação do texto do novo arcabouço fiscal pelo governo, o relator do projeto na Câmara dos Deputados entregou o parecer final com alterações em relação ao conteúdo inicial.

O texto inicial provocou reações negativas do mercado, com perspectivas de uma regra frouxa diante da necessidade de controle das contas públicas e a busca por uma trajetória sustentável da dívida pública federal. As principais críticas ao conteúdo inicial tiveram relação com a falta de gatilhos para contingenciamento de despesas em caso de não cumprimento das metas estabelecidas, a não obrigação do governo em cortar gastos em caso de frustração de receitas e a falta de responsabilização do Executivo além do aumento do número de itens fora da alçada da regra.

O parecer final do relator do projeto na Câmara trouxe alterações relevantes tanto positivas quanto negativas em relação ao texto inicial. Do lado positivo, o relator incluiu gatilhos de contingenciamento de gastos em caso de descumprimento da meta de resultado primário estabelecida, uma das principais críticas ao texto divulgado pelo governo. Os gatilhos foram divididos em dois estágios. No primeiro ano de não cumprimento da meta fiscal, fica proibido:

  • Criação de despesas obrigatórias;
  • Reajuste de despesas obrigatórias acima da inflação;
  • Concessão ou ampliação de despesas tributárias;
  • Criação ou aumento de benefícios e auxílios;
  • Mudanças em estruturas de carreira de servidores públicos que implique aumento de despesa;
  • Criação ou ampliação de dívidas que aumentem subsídios e subvenções.

Segundo o parecer do relator, tais medidas têm validade de um ano e, em caso de cumprimento da meta à frente, as proibições deixam de valer imediatamente. Adicionalmente, fica autorizado ao Presidente da República propor ao Congresso Nacional suspensão parcial das sanções desde que adote medidas compensatórias. No segundo ano de descumprimento da meta, além das proibições acima, fica vedado também:

  • Realização de concurso público que aumente o quadro de pessoal;
  • Contratação de pessoal;
  • Reajustes na despesa com pessoal.

Além da inclusão de gatilhos, o relator também incluiu no projeto a obrigação do governo de contingenciar despesas caso o cumprimento da meta esteja ameaçado por frustração de receita no ano. O texto do relator ainda reduziu o número de itens fora da alçada da regra, colocando, por exemplo, as despesas com aportes em empresas estatais, o Fundeb e o piso de enfermagem dentro do limite de gastos.

As medidas mencionadas acima foram positivas, mas de certa forma já esperadas pelo mercado diante das discussões entre parlamentares sobre o conteúdo inicial do texto, além de já existirem em grande parte na regra anterior do teto de gastos.

Pelo lado negativo, na nova versão do texto, a valorização do salário mínimo e o Bolsa Família ficaram fora dos gatilhos de contingenciamento de gastos. Além disso, o parecer final do relator incluiu dois dispositivos que permitem gastos extras de até R$ 80 bilhões em 2024 e 2025. O primeiro deles inclui de maneira direta a determinação de que as despesas cresçam pelo teto da regra de 2,5% acima da inflação, enquanto projetava-se que as despesas em 2024 fossem corrigidas pelo piso da regra, de 0,6% em termos reais. A segunda medida ocorreu devido à alteração do cálculo de correção das despesas, que passou a ser a partir da arrecadação nos 12 meses encerrados em junho do ano anterior. Com isso, a variação da inflação de julho a dezembro será incorporada aos gastos do governo por meio de crédito suplementar. Importante ressaltar que tal dispositivo só é válido para 2025. Adicionalmente, o texto final não prevê nenhuma responsabilização do governo federal em relação ao descumprimento da regra.

Foram mantidas as metas de resultado primário e suas respectivas bandas de tolerância.

De maneira geral, a maioria das alterações no texto foi amplamente esperada pelo mercado. O conteúdo final do projeto reforça o caráter expansionista em termos de gastos do novo arcabouço fiscal. As mudanças mantêm a perspectiva de que será necessário que o governo aumente a arrecadação para cumprir as metas de resultado primário estabelecidas, gerando preocupações em relação a um provável aumento da carga tributária. Além disso, o elevado patamar de despesas do ponto de partida da regra também inspira preocupações sobre a trajetória das contas públicas a frente.

As discussões políticas no Congresso para firmar os acordos de alteração do texto com líderes partidários foram intensas. Ainda assim, a tramitação de urgência do projeto foi aprovada com votação robusta. Apesar da orientação do governo para que a sua base não apresente emendas na votação em plenário, que deve ocorrer semana que vem, além das negociações do Presidente da Câmara em busca do mesmo objetivo, já foram apresentadas cerca de 40 emendas com mudanças para afrouxar ou endurecer a regra. No entanto, o relator do projeto disse que só deve alterar o texto em caso de acordo entre governo e Congresso Nacional e, portanto, a expectativa inicial é de que o texto seja aprovado sem novas alterações relevantes.

Apesar da melhora no mercado com fechamento da curva de juros e apreciação da taxa de câmbio desde a apresentação do texto inicial, as regras previstas no novo arcabouço fiscal ainda parecem insuficientes para controle das contas públicas e da trajetória da dívida pública federal. A forte dependência da ampliação de receitas do governo para o cumprimento da meta reduz a credibilidade do novo marco fiscal. Ainda assim, será necessário acompanhar a dinâmica de crescimento de gastos ao longo dos próximos anos e a postura do governo em relação às possíveis frustrações à frente para determinar com mais precisão a verdadeira capacidade de controle das contas públicas da nova regra fiscal.

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