Macroeconomia

Curto prazo x Longo prazo

A semana passada foi marcada por divulgações positivas do PIB e do mercado de trabalho, sinalizando um bom momento de curto prazo para atividade econômica. No entanto, o resultado primário divulgado reforça as dúvidas em relação a sustentabilidade das contas públicas no médio e longo prazo.

Em uma semana repleta de indicadores econômicos no país, a divulgação do PIB surpreendeu e veio bem acima da expectativa do mercado, sinalizando uma economia robusta no primeiro semestre do ano. Dados do mercado de trabalho também reforçaram o bom momento de curto prazo da atividade econômica no Brasil.

O PIB do segundo trimestre do ano registrou alta de 0,9% (QoQ), bem acima da nossa expectativa (0,4%) e da mediana do mercado (0,3%), e desacelerando em relação ao 1T23 quando apresentou crescimento de 1,8% (revisado de 1,9%). Esse é o oitavo trimestre consecutivo de avanço do PIB na comparação trimestral. Em relação ao 2T22 a atividade econômica avançou 3,4%, também desacelerando em comparação a divulgação anterior (4,0%), mas ainda consideravelmente acima da nossa expectativa e da mediana do mercado (2,7%).

Em relação ao desempenho trimestral, pela ótica da oferta, destaque positivo para a indústria, que registrou alta de 0,9% (QoQ), acelerando em relação a alta de 0,1% no 1T23 e puxado principalmente pelo bom desempenho do setor extrativo (1,8%) e construção (0,7%). A indústria da transformação também avançou, registrando alta de 0,3% após recuo de 0,7% no 1T23. Serviços avançaram 0,6%, estável em relação ao desempenho anterior, influenciado, especialmente, pela alta no setor financeiro (1,3%), transporte e armazenagem (0,9%) e outros serviços (1,3%). Ainda dentro de serviços, do lado negativo, destaca-se a desaceleração no comércio, saindo de 0,3% no 1T23 para avanço de 0,1% no segundo trimestre. O setor agropecuário foi o único a recuar (-0,9% QoQ) após forte avanço de 21,0% no trimestre imediatamente anterior. Esse desempenho é considerado robusto e pode ser creditado, principalmente, a safra recorde no ano, especialmente de soja.

No mercado de trabalho, o CAGED registrou criação de 142,7 mil vagas, levemente abaixo da nossa expectativa (147,0k) e da mediana do mercado (145,0k) e desacelerando em relação ao mês anterior, quando reportou 156,6k novas vagas. Apesar da desaceleração evidente na criação de vagas, o desempenho segue em patamar robusto para níveis históricos do país. Adicionalmente, a taxa de desemprego caiu de 8,0% para 7,9%, segundo a PNAD, com ganhos tanto no emprego formal quanto informal. Além disso, importante destacar que o rendimento médio real permaneceu estável em relação a divulgação anterior, o que denota que o bom desempenho do mercado de trabalho não tem gerado pressão altista em salários.

No que tange o cenário fiscal, o resultado primário registrou deterioração relevante, apesar de esperada. O resultado primário do Governo Central registrou déficit de R$ 35,9 bi em julho, revertendo o superávit de R$ 19,7 bi observados em julho de 2022, em linha com a nossa expectativa (- R$ 35,7 bi) e abaixo da mediana do mercado (- R$ 33,0 bi). No resultado acumulado no ano, o Governo Central atingiu déficit de R$ 77,0 bi, também revertendo o superávit de R$ 78,8 bi no mesmo período do ano anterior. Nos últimos 12 meses finalizados em julho, o resultado primário do Governo Central atingiu déficit de R$ 97,0 bi (-0,97% do PIB), ante superávit de R$ 120,4 bi em jul/2022.

A receita líquida do Governo Central atingiu R$ 160,4 bi em julho, queda de 5,3% em relação ao mesmo mês de 2022. As receitas administradas pela RFB recuaram 3,7%, somando R$ 119,6 bi, com destaque negativo para a redução na arrecadação com imposto de renda (-8,4%) e CSLL (-16,4%). Pelo lado positivo, note-se avanço na receita com Cofins (7,1%), PIS/Pasep (9,0%) e outras receitas administradas pela RFB (108,6%). A arrecadação líquida para o RGPS cresceu 6,8% (R$ 3,0 bi) em julho. As receitas não administradas pela RFB registraram queda de 32,4% (- R$ 12,7 bi). Destaque negativo, principalmente, para o recuo de 74,8% na receita com dividendos e participações (- R$ 5,4 bi) e na arrecadação com exploração de recursos naturais (- 27,7%; – R$ 5,7 bi).

A despesa total apresentou forte alta de 31,3% no mês, atingindo R$ 196,3 bi. O movimento foi influenciado, principalmente, por maiores gastos com benefícios previdenciários (41,7%; R$ 26,6 bi), parcialmente impactado por uma mudança no calendário de pagamento do décimo terceiro salário. Além disso, observa-se aumento nas despesas do Poder Executivo sujeitas a programação financeiras, tanto em relação as obrigatórias com controle de fluxo (34,7%; R$ 6,5 bi) como também as discricionárias (30,7%; R$ 3,7 bi). Em relação as despesas obrigatórias com controle de fluxo, o avanço é proveniente, principalmente, de maiores gastos com o Bolsa Família, que registraram alta de 78,8% (R$ 6,0 bi) em julho. Outras despesas obrigatórias (42,7%, R$ 8,9 bi) também registraram aumento, especialmente por maiores gastos com abono e seguro-desemprego (149,8%; R$ 5,1 bi), também influenciado por mudança no calendário de desembolso, e com apoio financeiro a Estados e Municípios (R$ 3,8 bi). Despesas com pessoal e encargos sociais (3,1%; R$ 1,1 bi) também registraram avanço em julho.

Em resumo, o bom desempenho da atividade econômica aliado a desaceleração da inflação sinaliza um cenário de curto prazo benéfico para o Brasil. Por um lado, o forte avanço do PIB afasta a possiblidade de aumento no ritmo de redução da taxa de juros estabelecido pelo Banco Central. Por outro, o bom desempenho do mercado de trabalho sem gerar pressão adicional no rendimento médio permite que a autoridade monetária mantenha o atual ritmo de corte de 0,5% esperado para as próximas reuniões de 2023. O déficit primário observado não deve afetar o plano do Banco Central para esse ano. No entanto, as incertezas relacionadas as medidas de aumento de arrecadação do Governo Federal colocam dúvidas sobre o atingimento das metas fiscais estabelecidas, o que tem potencial de aumentar a taxa de juros terminal do atual ciclo de queda. Prospectivamente, esperamos que a atividade econômica desacelere ao longo do segundo semestre do ano devido ao nível de juros ainda elevado e seu efeito defasado na atividade econômica.

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